'Não sou herói', diz bombeiro que salvou criança

O médico do Corpo de Bombeiros Maurício Augusto Gonçalves, de 39 anos, não se considera um herói. Mas foi ele quem resgatou a pequena Maria Luiza Souza Santos, de 2 anos e 4 meses, atingida por uma árvore na segunda-feira (16).
O Twitter da corporação chegou a anunciar a morte da menina, mas duas horas depois, retificou a notícia e anunciando que “após intervenção intensa, por mais de uma hora, a menina de 2 anos atingida por uma árvore no Largo da Concórdia foi ressuscitada”. A garota estava internada em estado grave até a manhã desta quarta-feira (18).
Confira o relato do herói que não se considera como tal:
"Eu e minha equipe estávamos em uma ocorrência no Vale do Anhangabaú (região central), quando fomos convocados para seguir ao Largo da Concórdia, no Brás, onde havia uma ocorrência de maior gravidade. Uma árvore tinha caído e atingido algumas pessoas. Percebi a gravidade e pouco tempo depois estávamos lá.
Não garoava, mas estava molhado. As vítimas já estavam sendo resgatadas por outros bombeiros. Porém, me chamou a atenção o corpo de uma mulher debaixo da árvore caída, inerte. Era Mônica Santos (que morreu). Fiquei comovido, sem tempo de pensar, tive de partir para a ação e socorrer as vítimas. Nesse momento, pensamos só nas questões técnicas para salvar a vida de quem está à sua frente.
O trabalho dos bombeiros no resgate realizado no Largo da Concórdia / Divulgação
Vi uma outra mulher reclamando de muitas dores e perguntava pela filha, a Maria Luiza. Percebi o estado da garotinha, bastante grave. Por isso priorizei o atendimento à criança. A Maria Luiza estava inconsciente, mas respirando e com batimentos cardíacos intactos.
De uma escala de trauma que vai de 3 a 15, sendo o número mais baixo é o estado de inconsciência absoluta, a menina apresentava 3. Estava com traumatismo craniano, e isso é sempre bastante preocupante. Além de atingir sua cabeça, a árvore também feriu o abdômen da criança, que também teve a perna direita quebrada. Decidi proteger suas condições neurológicas, a entubei e logo a induzi ao coma, para poupar as energias cerebrais. Isso foi feito para evitar danos secundários. Se houve sequelas, só saberemos após exames.
Ela foi encaminhada para a Santa Casa de São Paulo, na Santa Cecília (também na região central), que é referência em traumas, junto com a mãe, com fraturas nas pernas e nos braços, mas consciente. Maria Luiza foi levada ao hospital respirando, e em estado grave. Inclusive com risco de morte. Fiquei com ela, cuidando dela, por uns 40 minutos.
Maria Luiza está na Santa Casa / Reprodução
Apesar de não ter filhos, apenas dois afilhados, me coloquei no lugar dos pais daquela pequena. Me voltei para a mãe, que estava preocupada com a filha. Ela estava em choque e não conseguia assimilar a gravidade da situação. Perguntava por Maria Luiza o tempo todo e a medicamos para tentar acalmá-la. Nunca tinha atendido uma ocorrência tão inusitada. Foi triste, fiquei penalizado pela vítima fatal, mas feliz por ajudar a manter uma criança com vida.
Não me vejo como herói, estou à serviço dos Bombeiros para colaborar, é parte do meu trabalho, e tenho sempre de dar o melhor de mim às vítimas. Depois da adrenalina do salvamento, fiquei pensando naquela família, atingida e destroçada pela queda de uma árvore. Fico na torcida pela melhora da criança e da mãe, que nem sei o nome (a vendedora ambulante Dayse Cristina Souza Santos)".