Bairro sem infraestrutura faz Justiça bloquear R$ 438 mil da prefeitura
Juiz entendeu que sentença proferida há quase seis anos determinando asfaltamento das ruas e instalação de redes de distribuição de energia e água potável não foi cumprida integralmente

A falta de infraestrutura no Parque Residencial Pelicano motivou o bloqueio judicial de R$ 438.400,00 da Prefeitura de Dourados. Isso porque o juiz José Domingues Filho entendeu que sentença proferida há quase seis anos determinando asfaltamento das ruas e instalação de redes de distribuição de energia e água potável não foi cumprida integralmente.
Fruto de processo - que tramita sob o número 0805937-54.2014.8.12.0002 - movido pelo MPE-MS (Ministério Público Estadual), a condenação estabelecida em 5 de dezembro de 2014 pelo magistrado titular da 6ª Vara Cível da comarca previa pena de multa diária de R$ 1 mil por dia de descumprimento.
Atualmente, essa demanda judicial está em grau de recurso na 3ª Câmara Cível do TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), onde o agravo de instrumento número 1408718-30.2019.8.12.0000 foi recebido pelo desembargador Dorival Renato Pavan no dia 8 de agosto, ocasião em que ele negou a liminar (decisão de efeitos imediatos e provisórios) pleiteada pela prefeitura para suspender o bloqueio de verbas públicas porque considera necessária a análise do caso pelos demais desembargadores.
Quando condenou o município, o juiz de 1ª instância ordenou o “mapeamento de todas as quadras do Parque Residencial Pelicano que estão registradas sob a Transcrição n. 38.026 e registros dela decorrentes, identificando concretamente todas as irregularidades existentes no loteamento”, com “as informações registrais”.
O magistrado estabeleceu ainda a obrigação de “instalar toda a infraestrutura faltante”, “destacando as ruas e as redes de distribuição de energia e água potável, bem como disponibilizando áreas destinadas ao uso comum”, no prazo de 120 dias, contados do trânsito em julgado, e sob pena de multa diária, fixada em R$ 1 mil, em favor do Fundo Estadual de Defesa e Apoio e Desenvolvimento do Ministério Público.
Quatro anos desde a sentença, em dezembro de 2018 o MPE requereu a condenação do município por litigância de má-fé, “dado o tempo decorrido desde o trânsito em julgado e a inexistência de cumprimento da obrigação”, pedido negado pelo juiz responsável pela ação, que preferiu estabelecer novo prazo para manifestação da prefeitura.
Embora a administração municipal tenha argumentado atendimento parcial às ordens, no dia 14 de maio deste ano a Promotoria de Justiça voltou a queixar-se. Alegou que “mais uma vez esquivando-se do cumprimento das obrigações e agindo como se olvidasse de que fora condenado a implementar a infraestrutura faltante no loteamento”, o município “apenas imputou o dever de ampliar as redes de abastecimento d'água e distribuição de energia às concessionárias de serviço”.
Para o promotor de Justiça Amílcar Araújo Carneiro Junior, ficou “claro que o réu tripudia do comando sentencial e merece arcar com as consequências de suas omissões”. “As concessionárias dos serviços públicos não são parte na demanda”, afirmou, acrescentando que a prefeitura descumpriu ordem judicial ao “juntar mapa de informações registrais” em documento “que sabe ilegível, deixando decorrer o prazo de apresentação da via física em cartório para possibilitar a consulta da parte contrária”.
Foi a partir da apresentação de três orçamentos de empresas privadas interessadas em executar os serviços no bairro que o MPE requereu o bloqueio de verbas públicas, pedido desta vez acatado pelo juiz.
Após bloquear R$ 438.400,00 de uma conta bancária da prefeitura, em 4 de julho o magistrado determinou a intimação pessoal da prefeita Délia Razuk (sem partido) e do procurador-geral do município, Sérgio Henrique Pereira Martins de Araújo, para manifestarem-se sobre o bloqueio, considerando “o alto valor bloqueado nas contas públicas, a ausência de qualquer manifestação, mais o disposto na Lei de Responsabilidade Fiscal e na Lei de Crimes de Responsabilidade”.
Na resposta encaminhada dia 19 daquele mesmo mês, a prefeitura apresentou seu recurso, agora sob análise do TJ. À Corte estadual, alegou “que o bloqueio de verba contraria o interesse público, eis que já existe projeto de regularização elaborado pela administração municipal em tal sentido, sendo que a execução das infraestruturas demanda vultuosa soma de recursos, impondo-se captação junto à União e ao Estado”.
Acrescentou “que as obrigações impostas na sentença (mapeamento do loteamento, implantação de rede de abastecimento d'água, de rede de distribuição de energia elétrica e iluminação pública) já foram executadas e cumpridas satisfatoriamente, só não tendo sido possível a implantação da extensão da rede de água por fator alheio à sua vontade, qual seja, impossibilidade técnica da concessionária”.
Por fim, pontuou que “quanto ao sistema de águas pluviais, esgoto sanitário e asfaltamento”, a administração municipal disse ser “impossível a implementação de tais infraestruturas no exíguo prazo estabelecido na sentença, eis que demanda engenharia complexa, projetos específicos e volume vultuoso de recursos, sendo necessário o complemento da receita municipal com verbas advindas da União e do Estado; assim, tendo em vista o cumprimento da maioria das obrigações impostas pela sentença, que não é o caso de transferir a execução por terceiro”.
No entanto, no dia 8 de agosto o desembargador Dorival Renato Pavan pontuou “que o montante bloqueado, de R$ 438.400,00 (quatrocentos e trinta e oito mil e quatrocentos reais), não alcança cifra tão alta ao ponto de inviabilizar o orçamento público, impondo-se o prevalecimento da concretização dos direitos fundamentais perseguidos, posicionamento que deve ser mantido ao menos até o trâmite final deste recurso, oportunidade em que a matéria será devidamente esmiuçada”.