Juiz federal intima acusado pela morte de policiais civis de Dourados em 2006

Em "lugar incerto e não sabido" pelas autoridades, réu foi intimado por edital sobre a sentença que determina seu julgamento pelo tribunal do júri em São Paulo

Processo julgado pela Justiça Federal de Dourados terá desfecho em São Paulo (Foto: Reprodução/Google Street View)
Processo julgado pela Justiça Federal de Dourados terá desfecho em São Paulo (Foto: Reprodução/Google Street View)

O juiz Moisés Anderson Costa Rodrigues da Silva, da 1ª Vara Federal de Dourados, determinou a intimação via edital de um dos cinco índios acusados pelo assassinato de dois policiais civis e tentativa de homicídio contra outro em Dourados. Os crimes aconteceram no dia 1º de abril de 2006 e o julgamento pelo tribunal do júri foi desaforado para ocorrer em São Paulo, porque desembargadores federais consideraram haver preconceito contra indígenas em Mato Grosso do Sul.

Publicado na edição de quarta-feira (12) do Diário Eletrônico da Justiça Federal da 3ª Região, o edital de intimação estabelece prazo de cinco dias para eventual apelação ao réu Ezequiel Valensuela sobre a sentença de pronúncia na qual o magistrado remeteu o processo para ter desfecho após julgamento por um júri popular.

ASSASSINATOS

Nesse caso, foi transcrita a sentença proferida pelo juiz federal contra Carlito de Oliveira, Ezequiel Valensuela, Jair Aquino Fernandes, Lindomar Brites de Oliveira e Paulino Lopes. A Justiça Federal de Dourados determinou que esses réus sejam julgados pelo tribunal do júri em decorrência do crime ocorrido por volta das 16h30 do dia 1º de abril de 2006, na rodovia MS-156, entre a cidade de Dourados e distrito de Porto Cambira, em frente ao acampamento indígena "Passo Piraju".

Conforme a denúncia oferecida pelo MPF (Ministério Público Federal), os investigadores do 1º DP (Distrito Policial) de Dourados Rodrigo Pereira Lorenzatto, então com 36 anos, Ronilson Bartie, com 26 anos, e Emerson Gadani, à época com 33 anos, estavam num veículo descaracterizado da polícia e foram abordados numa emboscada pelos índios, que tomaram as armas dos policiais e executaram, com tiros e golpes de faca, Rodrigo e Ronilson. Ferido, Emerson Gadani fingiu-se de morto e conseguiu ser socorrido.

DESAFORAMENTO

"Decorrido o prazo, tendo em vista que foi deferido o pedido de desaforamento do julgamento da presente ação penal, remetam-se os autos para Seção Judiciária de São Paulo/SP", determinou o juiz federal Moisés Anderson Costa Rodrigues da Silva.

Esse julgamento foi desaforado para São Paulo por decisão unânime da Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que julgou procedente o pedido feito pelo MPF para que os acusados não fossem julgados em Dourados em razão de haver dúvida sobre a imparcialidade do júri douradense.

PRECONCEITO

Nesse acórdão, os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 3ª Região acolheram a argumentação dos procuradores da República de que "os integrantes da sociedade de Dourados/MS adquiriram, ao longo dos anos, um preconceito social grave contra os índios que entre eles ou perto deles vivem", acrescentando que "tal fato decorre desde o estranhamento puramente cultural até a luta e os graves conflitos fundiários que se estabeleceram em todo o Estado do Mato Grosso do Sul".

Publicada no dia 1º de setembro de 2016, a decisão inclui o parecer da relatora do recurso, desembargadora federal Cecilia Mello, para quem é "fato notório que o conflito indígena da região do Estado do Mato Grosso do Sul, que já resultou em inúmeras vítimas, evidencia uma situação de clara anormalidade, muito bem capaz de comprometer o interesse da ordem pública ou de afetar a imparcialidade do conselho de sentença, a justificar a adoção dessa providência extraordinária".

Para o TRF, "o conflito pulsante entre índios e não índios no Estado do Mato Grosso do Sul, acirrado pelos fundamentos étnicos, históricos, culturais, econômicos e etc. de ambos os lados, somado à sua repercussão regional, nacional e internacional, permitem e muito bem justificam que o julgamento seja desaforado para Foro não contíguo, onde poderão ser asseguradas todas as garantias necessárias para desejada intangilibilidade do julgamento".

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