Após morte de mulher e fim do lixão, caminhoneiro mora em árvore

Sem filhos e sem a companheira de uma vida toda, as viagens de caminhão ficaram no passado e Pereira começou a trabalhar com reciclagem

  • Campo Grande News

Há dois meses o pé de jamelão se tornou o teto de um caminhoneiro que sofreu dois duros golpes na vida e hoje passa os dias na rua dependendo da solidariedade de vizinhos que se tornaram amigos. Eclerison Pereira Silveira tem 62 anos, mas os machucados de uma explosão química, ocorrida há dois anos no lixão da Capital, fazem com que o morador de rua aparente ser muito mais velho.

Seo Pereira, como é conhecido entre os vizinhos, vive há três meses em uma estrada vicinal que liga os bairros Santa Emília e Serradinho. O local é um depósito frequente de lixo e restos de construção dispensados por carreteiros a céu aberto.

Há seis anos, a história de Pereira não dava nenhum indício de que ele chegaria ao ponto de ter um pé de jamelão como endereço. Natural de Ponta Porã e caminhoneiro de ofício, o homem se casou e viveu 15 anos com Maria.

Como ele próprio descreve, “os destinos da vida” foram responsáveis por trazê-lo em companhia da esposa para Campo Grande. Na época, um câncer atingiu Maria, que faleceu pouco tempo depois.

Sem filhos e sem a companheira de uma vida toda, as viagens de caminhão ficaram no passado e Pereira começou a trabalhar com reciclagem no antigo lixão de Campo Grande. Por mais de quatro anos o endereço do homem foi o bairro Dom Antônio Barbosa.

Em 2010 uma fatalidade vitimou Pereira e ele passou cinco meses internado na ala de queimados da Santa Casa. “Teve uma explosão química e me causou tudo isso. Eu não lembro o que aconteceu na hora, só sei que me levaram para o hospital e passei cinco meses lá”, conta.

Com mãos, braços, pernas e pés feridos por conta da explosão, a capacidade de trabalho de Pereira diminuiu e as dificuldades financeiras logo apareceram. O auge ocorreu no início do ano quando o lixão foi fechado e os antigos catadores realocados em uma cooperativa para atuar na UPL (Unidade de Processamento de Lixo).

“Eles me expulsaram do lixão e eu não tive para onde ir. Fiquei catando lixo na rua, mas há três meses tive que vir pra cá”, desabafa. A emoção diante da falta de teto dificulta que o morador de rua explique os caminhos que o levaram até o pé de jamelão, mas a falta de uma casa, de comida, de roupas e de companhia machuca o homem de 62 anos.

Com uma copa ampla, o local serviu de telhado para os poucos pertences que Pereira recolheu na rua. Um estrado velho, um colchão, lona e cobertor formam o local onde ele vive. Uma mochila com documentos, bolachas, lanterna e garrafa d’água são os únicos itens da mudança do morador da rua.

Sensibilizados com a situação, muitos vizinhos acolheram Eclerison e passam horas do dia conversando com o idoso. Outros levam comida para ele e até pensam em levar o homem para a própria casa.

“Eu já pensei em fazer uma peça lá em casa e levar ele pra lá. Minha condição não é boa, mas ajudo ele como posso. Trago comida e eu e meu pai demos dinheiro pra ele ontem”, conta Vitor Oliveira, morador do bairro São Conrado, vizinho ao local onde Pereira “escolheu” para morar.

Para o idoso, o futuro não reserva grandes surpresas, mas uma casa e ajuda de quem se comove com sua história são bem-vindas. “Eu não quero ir pra abrigo porque me sinto muito sozinho, mas queria roupas porque só tenho a do corpo. Meu sonho mesmo é ter uma casa e sair desse pé de árvore”, desabafa, emocionado, Eclerison.

O Campo Grande News tentou entrar em contato com a secretária da SAS (Secretaria de Assistência Social), Thais Helena, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.