Com aplicativos, ter um caso com atleta está a poucos cliques de distância

“Você consegue entrar na Vila?”, perguntou-me um atleta egípcio logo na primeira conversa pelo aplicativo de relacionamentos Bumble. A troca de mensagens até ali tinha sido trivial, mas o intuito dele estava claro: sexo. Algo que foi confirmado em todos os dias em que nos falamos. “Como foi seu dia? O que você está fazendo? A gente poderia se encontrar. Tipo agora” ou “Você não vai ficar livre nunca? Estou indo embora em breve”.
Quando as delegações chegaram a Londres, em 2012, saíram notícias de que uma suposta quantidade exorbitante de acessos havia derrubado o aplicativo Grindr, conhecido como point gay para encontros casuais. Na época, a empresa dona do app negou a relação entre os dois fatores: sim, o sistema caiu; não, não foi por usuários simultâneos demais. Mas foi o necessário para criar uma lenda olímpica.
Quatro anos depois e uma nova edição dos Jogos prestes a começar, voltou à tona a curiosidade sobre qual é o uso que atletas fazem de aplicativos de relacionamento durante a competição mais importante de suas vidas e quais são as reais chances que uma pessoa comum teria com um esportista de elite. Munida de um interesse sócio-antropológico, baixei os principais aplicativos e fiz o meu perfil. Todas as informações eram verídicas: foto, idade, ocupação. A ideia não era expor os atletas, mas relatar o que acontecia entre fronteiras virtuais quando uma cidade é tomada por gente bonita, saudável, bem sucedida e cheia de endorfina.
A única omissão de minha parte era o fato de ser casada. Mas, se o status matrimonial surgisse na conversa, seria tratado com honestidade, assim como as demais perguntas. “Estou aqui fazendo pesquisa, mas poderia cultivar algumas amizades no meio do caminho” era uma resposta inicial padrão. A maioria dos bate-papos girava em torno do que cada um fazia na cidade, o clima, nada que pudesse dar a impressão de que um encontro ao vivo estivesse em jogo. Apenas uma das pessoas com quem me comuniquei nestes quinze dias se interessou em saber qual era o tipo de pesquisa e se prontificou em ajudar.
A maioria dos atletas deixava claro em seu perfil que estavam no Rio pela competição. Alguns usavam a informação como xaveco inicial: “vim competir no ciclismo”, disse um deles. Na pequena mostra testemunhada, as modalidades eram variadas. Porém a presença de remadores e ciclistas chamava a atenção.
Não eram só os atletas que estavam atrás de relacionamentos online, equipe técnica e atletas aposentados também procuravam se dar bem. “Estou aqui na pista, meu atleta está descansando”, escreveu um treinador americano no Tinder. Querer transferir a conversa para o Whatsapp se transformou em uma prática comum, à qual recusei.
Por ter perdido a moda dos aplicativos quando solteira, a experiência trazia algumas novidades a mais. É tudo muito fácil e estranho ao mesmo tempo, selecionar pessoas numa espécie de cardápio. Em pouco tempo, a pesquisa foi tomada pelo clima olímpico e virou uma competição. Cada “match” com atletas era celebrado como uma cesta. Não há como negar que um suposto interesse da nata esportiva faz bem para o ego. As conversas, no entanto, não tinham a mesma vibração, mantiveram-se triviais e amigáveis como antes. A animação e o frescor caíam a cada dia.
Havia uma óbvia dissonância entre os nossos objetivos. Quando isso ficava claro, muitos desistiam da conversa, enquanto outros preferiam ir direto ao ponto. “Bom, para ser sincero, eu estou livre agora e só vou ficar aqui mais dois dias, e não tenho uma folga há taaanto tempo. Então, estou querendo me divertir um pouco agora e transar haha. Você gostaria?”, falou um tenista.
O movimento de atletas nos aplicativos se intensificou na segunda semana de Olimpíadas, e desde então diminuiu. Competições foram terminando, e o fato de diversos veículos de comunicação terem divulgado fotos e nomes dos atletas em busca de diversão também não deve ter ajudado.
O mundo virtual parece ser mesmo onde tudo acontece (ou começa). Além de ter distribuído 450 mil camisinhas nos alojamentos, o próprio Comitê Olímpico Internacional criou o impenetrável aplicativo Hub, app que pretender promover a socialização entre atletas. Para se cadastrar, é necessário colocar os dados da credencial e ter o perfil verificado, minimizando assim as chances de vazamentos de qualquer natureza. O que acontece na Vila fica Vila.