“Sexo, só consentido”, diz juíza que condenou marido a 9 anos de prisão por estuprar a mulher

Casamento

  • MarieClaire
Casada há 08 anos, mulher relatou que sofria  agressões do marido desde o ano do casamento (Reprodução)
Casada há 08 anos, mulher relatou que sofria agressões do marido desde o ano do casamento (Reprodução)

Em decisão rara no Brasil, a juíza Ângela Cristina Leão condenou a 9 anos, 4 meses e 15 dias de prisão, em regime fechado, um homem acusado de estuprar a própria mulher, em Goiás. Em sua sentença, a magistrada escreveu que “o matrimônio não dá direito ao marido forçar a parceira à conjunção carnal contra a vontade”. Embora caiba recurso, o réu não pode recorrer em liberdade.

Para chegar à decisão, a juíza conta que ouviu relatos da esposa, do próprio marido – que confessou ter ameaçado a mulher com uma faca-  e de testemunhas. “Ela relatou que desde o segundo ano de convivência, ele era muito agressivo, mas ela não contava para a família. Alega que gostava dele e não se separava. Conviviam juntos há oito anos, mas o ato sexual forçado foi a primeira vez”, disse.

Para a configuração do estupro, ela explica, não há, necessariamente, a coleta de exames que demonstrem lesões ou indícios. “A palavra da vítima é uma prova eficaz para a comprovação da prática, corroborada pelas demais provas e fatos”, afirma Ângela Cristina, que disse ter tido dificuldade de encontrar decisões semelhantes, já que muitas mulheres acabam não denunciando os maridos por medo ou vergonha. “Esta mesma vítima já tinha uma queixa anterior por lesão corporal e ameaça, mas retirou.”

Na sentença, a juíza cita os direitos garantidos às mulheres a partir da Constituição de 1988, que estabeleceu a violência sexual como uma das formas de violência doméstica e familiar. “Embora com o casamento surja o direito de manter relacionamento sexual, referido direito não é uma carta branca para o marido forçar a mulher ao ato sexual, empregando contra ela a violência física e moral que caracteriza o estupro.(...) Cônjuges não têm direito sobre o corpo alheio. Sexo, só consentido. Seja dentro ou fora  do casamento”, escreveu.

Em sua defesa, o marido disse que, mesmo após ter agredido, insultado e ameaçado a esposa com uma faca, ela teria concordado com o ato sexual, já que “tirou a própria roupa”. A juíza explicou que mesmo sem a esposa oferecer resistência física, o crime de estupro foi caracterizado pela “conduta de submissão e medo da vítima”, que relatou ter temido novas agressões e que a arma com a qual tinha sido ameaçada continuava com o marido.

Juíza há 13 anos e na comarca de Goianira (GO) há 8, Ângela Cristina afirma receber denúncias diárias de violência doméstica. Ela acredita que a decisão possa criar um precedente para que mais mulheres denunciem seus maridos. “Depois da Lei Maria da Penha, as denuncias se adensaram, com mais condenações. Acho que [a decisão] pode ajudar as mulheres a sair da inécia.”

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