Ela

Não vi nenhuma foto dela quando jovem. Será que tinha tirado algumas? As poses eram poucas naquela segunda fase de sua vida, que começou cedo, aos 13 anos, a partir do momento em que “fugiu” com seu “príncipe” para viver uma vida de mulher. Prática comum no começo do século passado.

Na primeira fase de sua vida, sim, deve ter feito algumas, mesmo se no lugar que morava não devia existir aparelhos fotográficos, mas certamente deve ter visto passar aqueles fotógrafos que trabalhavam em praças, feiras, que a gente chamava de lambe-lambe. Era filha de fazendeiro. Mas como partiu da forma que partiu, não deve ter levado quase nada além da roupa do corpo. Portanto, nunca vi foto de minha avó quando era criança.

Conheci-a lá pelos meus 12 anos quando o casal, vendo a idade avançar, “desceu” de seu nordeste querido para ficar mais próximo de seus filhos implantados na região já há anos. Sem fortuna, foram morar temporadas com um ou outro filho.

Portanto, nesta terceira fase de sua vida, mesmo se perdeu muito com o que a vida lhe proporcionou, guardava uma voz suave, acolhedora. Um rosto que ainda tinha algo de sua beleza inicial. Tentava imaginar como era no momento em que conheceu seu “príncipe” e teve a coragam de deixar o certo pelo incerto. Por que nunca perguntei mais sobre sua vida, sobre o que viveu no passado? Seus desejos, seus sonhos? Morria de curiosidade, mas me faltava coragem para abrir seus olhos sobre um tempo distante, que talvez não quisesse lembrar. Tão distante!

Nos últimos tempos, após ter perdido seu companheiro, vivia sozinha no seu quarto. Não via mais muito bem, mas não queria fazer o necessário para melhorar sua visão, apreciar o mundo que a cercava. O que fazia durante horas e horas? Revia sua infância? Sua adolecência? Sua vida de esposa e mãe? Em que mundo vivia?

Bom final de semana !