Que encontro!

  • Mazé Torquato Chotil
Que encontro!

Proponho hoje a tradução de um conto que escrevi, em francês, em competição no site do editor Short éditions. Quem quiser lê-lo em francês (e por que não, votar?), o endereço é http://short-edition.com/oeuvre/tres-tres-court/quelle-rencontre

Estou atrasada para meu curso que começa dentro de 20 minutos. Ainda preciso encontrar minha bolsa, descer, tirar o cadeado da bicicleta que esta em baixo do prédio, subir nela, e pedalar durante 15 minutos. Me apresso, mas estou descontraída, a canção de Chico Buarque dança na minha cabeça:

Essa moça tá diferente / Já não me conhece mais / Está pra lá de pra frente / Está me passando pra trás / Essa moça tá decidida / A se super-modernizar / Ela só samba escondida (...) Mas o tempo vai / Mas o tempo vem...

Esta canção foi utilizada em uma propaganda muito conhecida aqui na França, há pouco tempo, mas é prestigiada pelo público brasileiro desde 1969.

Oh, não! Esqueci minhas chaves! inclusive a do cadeado da bicicleta! Devo voltar. Felizmente, mamãe ainda esta em casa, mas são minutos perdidos. Logo hoje que tenho que apresentar meu trabalho sobre o Brasil!

Volto o mais rápido que posso, pelas escadas, subo os quatro andares. Esperando que o elevador esteja no andar na minha saída do apartamentor. Para isso aperto o botão do elevador e, em seguida, a da campainha do nosso apartamenton.

Trimmm, trimmmm, trimmmm, ouço o som da campainha.

- Sou eu, esqueci as chaves!

Assim que a porta se abre, entro rapidamente no quarto, pego as chaves em cima da escrivaninha e volto o mais rápido possivel. Mas... preciso ainda esperar o elevador que parou no terceiro andar.

Que falta de sorte! Vou realmente estar atrasada!

Respiro profundamente, uma vez, duas vezes e guardo a calma. Não posso me impedir de pensar no Chico que deve ter pelos 70 anos, mas guarda todo seu charme. Fisicamente impecável! E os olhos! Verdes ou azuis ? Em todo caso, claros! Seduziram muitas na sua época (e continua) com este ar de menino tímido, cabelos encaracolados, adoro! Que homem! mesmo na sua idade!

Foi em 1966, no Rio de Janeiro, nos seus 21 anos, que ele se tornou conhecido no país inteiro. Uma ascensão fulgurante com a canção A banda apresentada no festival de de música. Em plena ditadura, a juventude se exprimia pelas canções. Foi a época da criação da MPB – Música popular brasileira – e de rítimos tais que a bossa nova. Cinquenta e cinco mil exemplares da A Banda foram vendidos em quatro dias! A canção, para quem não conhece, fala de uma banda atravessando um vilarejo, onde todo mundo esquece seus problemas pra ver a banda passar cantando coisas de amor. Com lirismo a canção lembra a felicidade passada, perdida, ficada na lembrança. Ela é alegre, simples, e foi cantada pela juventude da época.

Eu suspiro. Chego finalmente embaixo e corro em direção da minha bicicleta. Devo abrir o cadeado o mais rápido possível. Finalmente, subo nela e começo a pedalar em toda velocidade. Devo sair pela rua Théophile Gautier, atravessar a Nacional 13, depois pegar a rua Ybry em direção do Norte, onde se encontra minha Escola.

Praft! Estou no chão! Brequei bruscamente para não bater num pedestre. Um estúpido que atressa a rua sem olhar! Ou fui eu que não o vi?

- Tudo bem ?

No chão, olho para o alto e não acredito no que vejo. Fecho-os e reabro-os imediatamente. Gostaria de ter certeza do que vejo. Não é possível ! Estou sonhando!

Gaguejo, como para mim mesma:

- Chico.... Chico Buarque ?

Um brasileiro do Rio de Janeiro em Neuilly sur Seine, cidade vizinha de Paris, nestas horas da manhã? O homem que vejo está preocupado. Cabelos preto e branco, encaracolados, um nariz um pouco redondo, uma pele bronzeada... Segundo o que li, ele gosta de jogar futebol nas praias da cidade. Que classe! Quel olhos!

- Sim, senhorita, sou eu… você se machucou ?

A voz que ouço é uma voz tímida e atencionada, com um sotaque com muito charme. Não tenho nada, cai, mas não me machuquei. Me levanto e levanto a bicicleta com sua ajuda.

- Não, tudo bem, obrigada, consigo dizer sem tirar os olhos de seu rosto que mostra um sorriso gentil, mesmo se preocupado. Ele, o homem da canção que dançava na minha cabeça naqueles instantes!

Que encontro! por ser inesperado, é inesperado!

- Tenho um encontro na Sacem[1], la. Ele aponta com o dedo para o prédio na outra esquina.

Me « acordo », infelizmente! Penso no curso que não deve tardar a começar. Sem mim!

- Preciso ir. Estou atrasada para meu curso. Obrigada, obrigada, muito obrigada!

A cena não durou muito, dois minutos? Subo novamente na bicicleta, com a cabeça nas nuvens, mas o olhar redobrando de atenção para a travessar a nacional 13, sempre cheia neste momento da manhã.

[1] Associação francesa que administra os direitos autorais de artistas.

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Associação francesa que administra os direitos autorais de artistas.

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