Juiz determina adequação em contrato de R$ 21 milhões entre prefeitura e empresa

Processo movido pelo MPE contra a Prefeitura de Dourados aponta riscos às crianças no transporte escolar por lambança em licitação milionária

Contrato de R$ 21 milhões com empresa do transporte escolar não previu monitores nos ônibus (Foto: A. Frota)
Contrato de R$ 21 milhões com empresa do transporte escolar não previu monitores nos ônibus (Foto: A. Frota)

A Justiça determinou imediata adequação do contrato de R$ 21 milhões firmado entre a Prefeitura de Dourados e a GWA Transportes LTDA para realização do transporte escolar. Alvos de processo movido pelo MPE-MS (Ministério Público Estadual) por colocarem em risco crianças transportadas sem o devido cuidado previsto na legislação, administração municipal e empresa têm 10 dias para disponibilizar monitores nos ônibus, sob pena de multa diária de R$ 10 mil. 

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No despacho proferido dia 1º, o juiz José Domingues Filho, da 6ª Vara Cível de Dourados, acatou o pedido de liminar (decisão provisória e de efeito imediato) feito pelos promotores Luiz Gustavo Camacho Terçariol, da 17ª Promotoria de Justiça, e Ricardo Rotunno, da 11ª. Eles haviam ingressado com a Ação Civil Pública número 0900103-39.2018.8.12.0002 no dia 27 de setembro. (clique aqui para ler mais)

SEM AUMENTO

Além de “determinar aos requeridos que disponibilizem, no prazo de 10 (dez) dias, um monitor para cada veículo de transporte escolar objeto do contrato n. 071/2017/DL/PMD, devidamente capacitado para a função, ‘com a finalidade exclusiva de zelar pela segurança dos alunos, nos moldes da Lei Municipal n. 2.174/98, sob pena de pagamento de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais),em caso de descumprimento’, além de outras penalidades administrativas e apuração de eventual configuração de crime”, o magistrado atendeu outro pedido do MPE.

Ele também proibiu o Município de Dourados de realizar “qualquer aditivo no contrato n. 071/2017/DL/PMD, visando o aumento de seu valor em decorrência do cumprimento dessa tutela”.

Contratada no dia 10 de março de por R$ 8.899.564,80 49, após vencer licitação para fornecer 49 veículos com motoristas para atendimento aos estudantes da aldeia indígena e dos distritos de Vila Formosa, Itahum, Vila Vargas, Panambi, e Indápolis, a GWA Transportes LTDA teve o contrato aditivado menos de quatro meses depois, no dia 31 de janeiro de 2018, quando passou a R$ 21.358.955,52.

LAMBANÇA MILIONÁRIA

Secretário de Educação reconheceu
Secretário de Educação reconheceu "lambança" em licitação de R$ 21 milhões que colocou em risco a vida de crianças (Foto: Reprodução)

Apesar de ter tanto dinheiro público envolvido, essa licitação teve uma lambança, conforme reconhecido pelas próprias autoridades municipais e revelado pela 94FM no dia 20 de junho, na matéria intitulada “Lambança em licitação deixa transporte escolar sem monitor e crianças em risco”.

As informações foram apuradas na Ata nº 04/2018, confeccionada durante agenda oficial ocorrida dia 19 de abril na sala de reuniões da Casa dos Conselhos da Educação e publicada na edição 19 de junho do Diário Oficial do Município. (a publicação pode ser conferida clicando aqui, a partir da página 8)

Naquela ocasião, membros do Comacs/Fundeb (Conselho Municipal de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) buscavam esclarecimentos sobre e a execução dos recursos do PNATE (Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar).

DENÚNCIAS DE PAIS

Ônibus do transporte escolar sem monitores colocam em risco a vida das crianças, segundo denúncia do MPE e decisão judicial (Foto: A. Frota)
Ônibus do transporte escolar sem monitores colocam em risco a vida das crianças, segundo denúncia do MPE e decisão judicial (Foto: A. Frota)
De acordo com o documento oficial, durante a reunião a conselheira Deborah Salette da Cruz mencionou “a necessidade do monitor no transporte escolar, haja vista denúncias e relatos de pais que expõem as situações a que as crianças menores estão expostas”.

“O Secretário de Educação Dr. Upiran, relata que este cuidado e responsabilidade não são do motorista, visto que ele tem outras atribuições, entende, pois, que qualquer coisa que aconteça vai onerar os cofres do município. O secretário explica que a exigência de se ter monitor é decorrente de lei federal, mas o município não tem monitor por questão de natureza administrativa devido a uma ‘lambança’ no processo licitatório, pois houve irregularidade e modificação, na última hora, sendo suprimida a figura do monitor, não consta, portanto, no contrato, hoje precisaria efetivamente, é preciso adotar a providência, visto que os pais cobram, o sindicato verifica a necessidade, e com razão”, descreve a ata.

INCIDENTES GRAVES

Após a revelação feita pela 94FM, o MPE instaurou inquérito para investigar essa situação e ao proporem a ação civil pública, os promotores detalharam que o edital da licitação previa, originalmente, a obrigatoriedade de fornecimento dos monitores, o que atende a própria legislação nacional. Contudo, uma alteração posterior excluiu essa exigência.

“Transportar crianças menores de cinco anos de idade sem o acompanhamento de um profissional capacitado para tanto, coloca em risco a integralidade física dos pequenos, os quais sem supervisão, ‘acabam soltando o cinto de segurança e ficando em pé no Ônibus’. Certamente, não é necessário que ocorram incidentes graves com estes alunos para que se aclare o periculum in mora”, pontuou o MPE ao pedir urgência no julgamento.

RISCOS DE DANOS

Ao conceder a liminar que determina imediata disponibilização de monitores nos ônibus do transporte escolar, o juiz José Domingues filho mencionou que a legislação vigente em todo o Brasil prevê esse serviço e considerou que “mesmo que não houvesse a lei nesse sentido, é responsabilidade da empresa zelar pelo cuidado com as crianças dentro dos ônibus, para prevenir danos que possam ocorrer”.

“Mesmo porque, o comportamento delas não analisa riscos e perigos dada sua capacidade intelectual em formação e, portanto, devem ser monitoradas por pessoa com habilitação técnica para isso. Atividade essa que não pode ser conferida e acumulada ao motorista, que, pelas normas de trânsito, não pode ter sua atenção na condução do veículo atrapalhada”, ponderou o magistrado, acrescentando que, “nesses moldes, descabe qualquer aditivo contratual para arcar com o custo financeiro disso, porquanto é responsabilidade da empresa contatar todo o pessoal necessário para a boa execução do serviço a ser prestado. Enfim, porque o contrato está em vigência e o risco de danos às crianças é presente e diário. Logo, estão configuradas a probabilidade do direito reclamado e o perigo de dano, nos termos do art. 300, da processual civil”.


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