Índios são despejados de fazenda 14 meses após ordem judicial

Índios tiveram barracos destruídos e foram retirados da fazenda que ocupavam (CIMI/Divulgação)
Índios tiveram barracos destruídos e foram retirados da fazenda que ocupavam (CIMI/Divulgação)

Os guarani-kaiowá que ocupavam desde 2013 uma parte da Fazenda Serrana, em Dourados, foram despejados na manhã desta quarta-feira (6) por policiais federais. Os agentes cumpriram um mandado de reintegração de posse expedido há 14 meses pela 1ª Vara da Justiça Federal. O magistrado do caso, Fábio Kaiut Nunes, já havia ameaçado investigar crime de prevaricação por causa da desobediência à sua ordem.

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Reivindicado pelos indígenas como Tekoha Apyka'i, o local já havia sido ocupado em 2008 e está atualmente arrendado para a Usina São Fernando, cujo dono é o pecuarista José Carlos Bumlai, um dos presos da Operação Lava Jato. Conhecido como Curral de Arame, esse acampamento indígena foi retratado pelo jornal inglês The Guardian em maio deste ano, que apontou o elevado índice de mortes entre índios no Mato Grosso do Sul.

Nesta manhã, a PF contou com o apoio da Polícia Rodoviária Federal e de duas equipes da Força Tática do 3º BPM (Batalhão de Polícia Militar) de Dourados. Comandante da unidade da PM, o coronel Carlos Silva destacou que a reintegração foi pacífica, sem confrontos.

O CIMI (Conselho Indigenista Missionário), entidade ligada à Igreja Católica que apoia a causa indígena, divulgou informe no qual classifica a ação desta manhã como uma “operação desproporcional”. “Os pertences dos indígenas foram retirados e colocados em caminhões, e todos os barracos foram destruídos com um trator do tipo pá carregadeira”, informou o Conselho.

Pessoas ligadas à causa indígena em Mato Grosso do Sul utilizaram as redes sociais para lamentar o despejo. Segundo elas, assim que deixaram a propriedade, os guaranis-kaiowá voltaram a levantar seus barracos, desta vez na outra margem da BR-463, em frente ao território que reivindicam como de ocupação tradicional.



“Os caminhões levariam os pertences dos indígenas a qualquer lugar que eles quisessem. O lugar escolhido foi a beira da estrada em frente ao tekoha, onde por mais de uma década viveram os Kaiowa e, agora, debaixo de chuva forte, a 10 graus de temperatura, os indígenas voltam a erguer novos barracos”, informou o CIMI.

Procurado pela reportagem, o coordenador regional da Funai (Fundação Nacional do Índio) em Dourados, Vander Aparecido Nishijima, alegou ter tomado conhecimento do despejo por telefone, já que participava de uma reunião em Campo Grande. Os servidores indicados por ele para passarem detalhes sobre o auxílio aos índios despejados não foram encontrados até o fechamento desta matéria.

O delegado da PF indicado como responsável pela operação não atendeu às ligações da reportagem.

No dia 14 de junho, quando publicou o despacho determinado a reintegração de posse da fazenda “no prazo improrrogável de 15 dias”, o juiz federal criticou a desobediência da PF, que até então não atendia a ordem expedida há 14 meses.

“A inércia do Poder Público pode fomentar o início de novas ocupações pelas Comunidades Indígenas, além de incentivar os proprietários rurais a se valerem do desforço imediato, por vezes se valendo da prática de atos de violência. O panorama que se revela a partir da análise de todo o processado, é de absoluto desprestígio às instituições constituídas, descrença na tutela jurisdicional em seu aspecto material e, pior, aumento da tensão nas questões indígenas, quando o objetivo era exatamente o oposto”, relatou o magistrado.

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